sexta-feira, 21 de março de 2008

CABARET

“Sou a divina decadência.”


Berlim, 1931. A cidade, marcada por uma crise econômica, está aberta ao mundo e aos sentidos. Para esquecer os problemas do dia a dia, as pessoas divertem-se na noite, em lugares como o Kit Kat Club. Toda noite, o apresentador dá as boas vindas ao público, dizendo: Willkommen, Bienvenue, Welcome. Seu rosto, diabolicamente pintado, reflete-se nos bastidores. O filme retrata o clube noturno como se fosse um espelho deformante, apresenta-o como uma caricatura da vida. Life is a cabaret: a canção interpretada por Liza Minelli deve ser entendida no sentido literal.

Como muitos forasteiros, o estudante inglês Brian (Michael York) sente-se atraído pela palpitante metrópole. Conhece em uma pensão Sally Bowles (Liza Minelli), que trabalha como cantora no Kit Kat Club e sonha em ser uma estrela de cinema. Para isso, põe em jogo seu temperamento e seu corpo. Por causa de sua liberdade sexual e sua inclinação ao luxo, Sally é fruto da modernidade hedonista, que trás uma profunda saudade de uma felicidade perdida. Contudo, sobe essa aparente decadência, surge cada vez mais uma personalidade infantil e vulnerável, e Brian, que num primeiro momento resiste às investidas sexuais de Sally, apaixona-se por ela.

A relação é feliz até o momento em que surge na vida de Sally o barão Max von Heune (Helmut Griem), que é rico, jovem e bem apessoado. Seduzida por ele, perde as estribeiras. Brian fica com ciúme e , ao mesmo tempo, eroticamente confuso. O triângulo, simplesmente insinuado no ínício, é explícito ao final – ambos acostumam-se com o barão. Sally fica grávida. Enquanto Sally e Brian vivem um desastre particular, nas ruas de Berlim os nazistas preparam-se para tomar o poder. Com a perspectiva do nazismo crescente, que pretende descartar a modernidade urbana e utiliza em ideologia os valores rurais conservadores, os planos de vida do casal parecem destinados ao fracasso. Brian volta à Inglaterra e Sally tratará de triunfar em Berlim, como atriz.

Apesar de “Chicago” (2002), “Cabaret” é sem dúvida um dos últimos grandes musicais do cinema. A diferença da maioria destes filmes - que incluem “Sinfonia em Paris” (1951) ou “Cantando na Chuva” (1952) - é que são atemporais ainda nos dias de hoje. No caso de “Cabaret”, a explicação talvez esteja, por um lado, no extraordinário sucesso que suas canções tenham produzido e, por outro, em Liza Minelli, que à época tinha vinte e cinco anos e cuja identificação com “Cabaret” não se repetiu com nenhuma outra atriz em relação a um filme.

Além disso, há a peculiar estrutura do filme. Em relação ao que ocorre nos demais filmes do gênero, em “Cabaret” há uma separação clara entre os números musicais e a ação. Nenhum personagem começa a cantar diretamente; antes de fazê-lo, as entradas colocadas em cena pelo diretor e coreógrafo Bob Fosse pontuam a história. O apresentador, que não está envolvido na trama, faz as intervenções de forma ácida. Os elementos da ação e os números musicais se desenvolvem de forma paralela. É o caso da dança típica da Bavária que tem cortes rápidos, intercalando imagens dos nazistas golpeando brutalmente o diretor do clube noturno - a cena de violência real parece fazer parte da dança e vice-versa.

Por suas cenas escuras – que nos remete à influência expressionista -, por sua música - inspirada em Kurt Weill -, e pela coreografia única de Bob Fosse, “Cabaret” vem a ser um resquício dos anos vinte, ainda que não faltem referências à década de 70, época de realização do filme. O resultado final do filme deve-se sobretudo nas cenas cantadas e dançadas, que ocorrem em cena. Somente uma exceção: em um Biergarten (cervejaria ao ar livre) um adolescente loiro canta uma canção popular. A príncipio, aparece seu rosto, mas depois a câmera descobre os braços com a suástica. Um após o outro, todos os clientes da cervejaria vão unindo-se à canção, que muda de ritmo e converte-se em música marcial até que, ao final todos, levantam suas mãos saudando Hitler. Li que na versão passada na Alemanha esta cena foi cortada; somente depois de muitos protestos de críticos, ela foi reintegrada ao filme. Inesquecível.



Cabaret (Cabaret)
1972 – EUA - 124 min. – Colorido – MUSICAL
Direção: BOB FOSSE. Roteiro: JAY PRESSON ALLEN, baseado na peça homônima de JOE MASTEROFF, JOHN KANDER e FRED EBB. Fotografia: GEOFFREY UNSWORTH. Montagem: DAVID BRETHERTON. Música: JOHN KANDER e RALPH BURNS . Produção: CY FEUER, para a ABC CIRCLE FILMS e AMERICAN BROADCASTING COMPANY.

Elenco: LIZA MINELLI (Sally Bowles) MICHAEL YORK (Brian Roberts), HELMUT GRIEM (Maximilian von Heune), JOEL GREY (Apresentador), FRITZ WEPPER (Fritz Wendel), MARISA BERENSON (Natalia Landauer), ELISABETH NEUMAN-VIERTEL (Srta. Schneider), HELEN VITA (Srta. Kost), SIGRID VON RICHTHOFEN (Srta. Mayr), e GERD VESPERMANN (Bobby).

Prêmios:
Oscars de Melhor Direção (Bob Fosse); Melhor Atriz (Liza Minelli); Melhor Ator Coadjuvante (Joel Grey); Melhor Fotografia (Geoffrey Unsworth); Melhor Trilha Musical (Ralph Burns); Melhor Montagem (David Bretherton); Melhor Direção de Arte (Rolf Zehetbauer, Hans Jürgen Keibach e Herbert Strabel) e Melhor Som (Robert Knudson) /1972.

Trailer Original:


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O Show Deve Continuar

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