“O caráter do homem está em seu rosto.”
A partir dos quadros de Michelangelo Amerighi da Caravaggio, Derek Jarman, um diretor e roteirista britânico, vislumbrou a difícil vida, cheia de honra e escândalos, do pintor renascentista que morreu em 1610 por volta dos 30 anos.O diretor, também um pintor, mostra a história numa sucessão de vidas instáveis - inicia com Caravaggio no seu leito de morte num quarto simples, tendo por companhia um serviçal mudo, e pula, geralmente de forma perplexa, de volta à infância do artista, sua carreira e, principalmente, seu relacionamento com Ranuccio e uma prostituta chamada Lena, a qual ambos amam, embora não tanto. Todas as cenas são internas – o filme foi feito em um estúdio inglês com o orçamento de US$ 475.000. A câmera de Gabriel Beristain capta o sentido da obra de Caravaggio, a iluminação ultradramática que surge do nada, transformando os tipos realistas que Caravaggio retratou em personagens com pouca sintonia com o mundo real.
Esse clima de realismo fantástico está implícito nos diálogos, que transitam do puramente coloquial ao pseudopoético – “Gotas salgadas de meus dedos deixando um rastro de lágrimas nas areias incandescentes”. Para piorar as coisas, as personagens surgem de repente na Itália renascentista e no presente, como se fossem as paginas de uma revista, em que as cenas são trocadas à medida que as músicas vão sendo adequadas. Caravaggio e Ranuccio, sobre o qual pouco se conhece a não ser que o artista na verdade matou um homem com tal nome numa luta a faca, andam de motocicleta e consertam caminhões.. Se eles vivessem nos dias de hoje, o diretor diria que eles provavelmente estariam se prostituindo.
Tudo isso produz momentos confusos; o filme é belo de ser assistido e, talvez, sua falta de conjunto é uma forma de demostrar o que aparentemente o diretor entende como sendo arroubos da imaginação de Caravaggio. Infelizmente, esse projeto pretensamente arrojado é retratado como um conto banal – talvez sensacionalista – de dois amantes num ambiente predominantemente homossexual e extremamente violento, que se dão mal com uma mulher. Em uma cena super elaborada e longa, moedas de ouro passam da boca de Caravaggio para a de Ranuccio e, na seqüência, para a de Lena, mostrando assim uma insana ligação sexual; e em outra cena, os dois homens untam-se com sangue como sinal de sua profunda e fatal paixão. Essas seduções estão mais para uma opereta sem música.
Como Caravaggio, Nigel Terry é obrigado a gastar muito de seu tempo (quando não está em seu leito de morte) encarando modelos que ele está prestes a transformar em obra de arte. “O caráter do homem está em seu rosto, ele fala”. Não há nada de errado com o rosto de Nigel Terry ou com o rosto de Sean Bean, que interpreta o rude Ranuccio, mas nenhum foi dotado de caráter por Jarman. Michael Gough está expressivo no papel de patrono de Caravaggio, Cardeal Del Monte.
Caravaggio é um experimento excessivo, mas com suficientes flashes de ingenuidade e brilho visual que vale a pena ser visto.
"Caravaggio" (Caravaggio)
1986 – INGLATERRRA - 93 min. – Colorido – DRAMA
Direção: DEREK JARMAN. Roteiro: DEREK JARMAN. Fotografia: GABRIEL BERISTAIN. Montagem: GEORGE AKERS. Música: SIMON FISHER TURNER. Produção: SARAH RADCLYFFE, distribuído pela British Film Institute.
Elenco: NIGEL TERRY (Caravaggio) SEAN BEAN (Ranuccio), GARRY COOPER (Davide), SPENCER LEIGH (Jerusaleme), TILDA SWINTON (Lena), MICHAEL GOUCH (Cardeal Del Monte), DAWN ARCHIBALD (Pipo) e ROBBIE COLTRANE(Scipione Borghese).
Trailer Original:
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Edward II
7 comentários:
Ouvi falar que esse filme tem cenas muito fortes... É verdade?
Muito interessante , vou ver se consigo ver este filme.
Beijos.
Nunca ouvi falar deste filme, mas seu texto despertou minha curiosidade.. vou procurar vê-lo se chegar a encontrá-lo..
vlws
Quem sabe ...
vamos ver quando puder achar o filme ...
abraços
Eu vi esse filme durante o curso de literatura portuguesa I na faculdade e fiquei admirado com a coragem do diretor. Ela peca em alguns detalhes históricos, mas no geral vale a pena uma conferida.
Mídia e cultura:
http://robertoqueiroz.wordpress.com
Não assisti este filme, mas a obra de Derek Jarman é polêmica.
Este filme fez algum sucesso nos festivais de arte e tem um ótimo elenco.
Abraço
Miguel, é verdade.
Miriam, assita. Embora seja um pouco lento.Beijo.
Sérgio, valeu cara. Veja lá e depois diga o que achou. Abcs.
Roberto, é verdade, concordo.
Hugo, põe polêmico nissso. Mas o filme tem lá suas qualidade artísticas.
Abcs
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