domingo, 28 de setembro de 2008

MAMÃE É DE MORTE

“Você acha que vou precisar de um advogado?.”


Caso você vá construir sua carreira no mau gosto, cedo ou tarde você terá que lidar com o ícone mais sagrado de todos – a maternidade. John Waters é o cara para fazer isso, porque aparentemente ele somente filma o que venera. Em “Mamãe é de Morte” ele vai a fundo à idéia de mostrar que toda mãe americana é capaz de levar qualquer mulher à loucura. O que poderia ser mais simpático? Kathleen Turner entrega-se a um dos melhores papéis de sua carreira, interpretando Beverly Sutphin. Ela é uma dona de casa de Baltimore – perfeita, meticulosa, excessivamente ordeira – casada com um dentista (Sam Waterston) e mãe de dois adolescentes com nomes absolutamente estranhos: Chip e Misty. A maneira de ser uma mãe perfeita é mostrar que Beverly desenvolveu uma tendência de assassinar todos que a tiram do sério.

Como alguém ousa sugerir que seu filho Chip (Matthew Lillard) necessita de terapia? Beverly responde com descrença natural, e daí ao encontrar o professor fora da sala de aula no estacionamento atropela-o, matando-o. Quando Misty (Ricki Lake) fica interessada em um rapaz, ela reclama com sua mãe não ser correspondida: “Gostaria que ele morresse”.

John Waters, naturalmente, não está tão vulgar como em "Pink Flamingos" (famoso pela cena escatológica do cachorro). Após filmes mais leves retratando a adolescência dos anos 50 e 60, parece que ele “entra na onda” e fica menos cáustico. Com “Mamãe é de Morte” ele traça uma sátira urbana, um filme muito engraçado e cativante que mesmo qualquer mãe adoraria assistir.

O filme é menos ácido do que aparenta ser. Embora a história se passe nos anos 80, Beverly parece revestida do clima dos anos 50 que tanto agrada o diretor: sitcoms que mostravam o desregramento de uma geração de famílias.

Moldado ao faro de John Waters, captura os detalhes mais atormentados da vida suburbana. Um toque especial é a forma que Beverly cantarola "Daybreak", de Barry Manilow, enquanto limpa a casa ou segue em direção ao próximo crime. Kathleen Turner interpreta a boa mãe com tal brilho e convicção que seu lado assassino parece, por mais absurdo que seja, plausivelmente correto. E Sam Waterston, fugindo de seus papéis mais sérios, mostra equilíbrio nesta comédia, funcionando perfeitamente como um marido confuso.

Entretanto, “Mamãe é de Morte” é meio desequilibrado e um pouco previsível. Quando a polícia desconfia de Beverly e a segue até a igreja com toda a família no carro, ela diz: "Você acha que vou precisar de um advogado?" O astuto Chip responde: "Você precisa de um agente." Suzanne Somers, em breve aparição, de repente deseja fazer uma minissérie da vida de Beverly. O frenetismo da mídia sobre a assassina mega-star é muito real para funcionar com o uma sátira.

Apesar da abordagem branda feita por Waters, há alguns momentos nojentos em “Mamãe é de Morte”, como aquele em que um close naquilo que parece um rim num espeto de churrasco. Ele, afinal de contas, não perdeu o sentido das coisas. Quem teria perdido?, parece perguntar. A famosa mamãe assassina ou a vizinha que quando um ovo cerâmico quebra, diz: “É Franklin Mint! Eu coleciono Franklin Mint!”.

Uma vítima aluga um vídeo de “Annie”, acomoda-se na poltrona e começa a cantar “Tomorrow”. Nas barbas da lei, isso não justifica um assassinato. Mas há maiores questões éticas envolvidas. Elas explicam porque, no mundo de John Waters, essa mamãe matadora é uma heroína da cultura pop. Impagável.



"Mamãe é de Morte" (Serial Mom)
1994 – EUA - 95 min. – Colorido – COMÉDIA
Direção: JOHN WATERS. Roteiro: JOHN WATERS. Fotografia: ROBERT M. STEVENS. Montagem: JANICE HAMPTON E ERICA HUGGINS. Música: BASIL POLEDOURIS. Produção: JOHN FIEDLER E MARK TARLOV, para a SAVOY PICTURES.

Elenco: KATHLENN TURNER (Beverly Sutphin) SAM WATERSTON (Eugene Sutphin), RICKI LAKE (Misty Sutphin), MATTHEW LILLARD (Chip Sutphin), SCOTT MORGAN (Detetive Pike), WALT MACPHERSON (Detetive Gracey), JUSTIN WHALIN (Scotty Barnhill), PATRICIA DUNNOCK (Birdie), LONNIE HORSEY (Carl Pageant), TRACY LORDS (Namorada de Carl) e MINK STOLE (Dottie Hinkle).

Trailer Original:


Do mesmo diretor:



Cry Baby

sábado, 27 de setembro de 2008

TRIBUTO A PAUL NEWMAN

Paul Newman foi um dos últimos grandes astros de Hollywood, por mais que isso possa ser considerado um chavão. Se Marlon Brando e James Dean eram tidos como os rebeldes definitivos, Paul Newman era sem dúvida, o contraponto a eles – o bom moço, renegado talvez, selvagem com certeza, mas nunca com o espírito mau dos outros dois – seja como Hud, em “O Indomável”, Cool Hand Luke ou Butch Cassidy.

Ele atuou em mais de 65 filmes por mais de meio século, interpretando diversos papéis com talento, inteligência, refinamento e humor, tendo conseguido o que muitos atores de sua geração achavam impossível: manter o status de grande estrela, ainda na maturidade.

Paul Newman fez seu debut em Hollywood no filme “O Cálice Sagrado” (1954), mas o estrelato chegou um ano e meio depois quando ele pegou o papel anteriormente destinado a James Dean do boxeador Rocky Graziano em “Marcado pela Sarjeta”(1956). James Dean havia morrido no acidente de carro antes do roteiro ter sido finalizado.

Foi uma rápida ascensão para Paul Newman, mas até ser considerado um ator sério não foi tão rápido. Em função basicamente de seu jeito de estrela, sua aparência clássica. “Eu defino meu epitáfio”, ele teria dito uma vez. “Aqui jaz Paul Newman, que cometeu uma falha, porque seus olhos ficaram castanhos”.

A filmografia de Paul Newman foi uma enxurrada de heróis e anti-heróis ao longo de décadas e décadas. Em 1958, ele fez um homem determinado a casar com uma sulista na adaptação de William Faulkner “O Mercador de Almas”. Em 1982, em “O Veredito”, interpretou um advogado alcoólatra que encontra em um caso de negligência médica a chance de se redimir. Em 2002, aos 77 anos, ainda com muito vigor, interpretou o gângster chefe de Tom Hanks em “Estrada para Perdição”. Foi seu último papel de envergadura no cinema. Ele fez a voz do veterano corredor de carros Doc, no desenho animado da Pixar “Carros”, de 2006.

Poucos atores de sua época ousaram interpretar pessoas de caráter duvidoso ou cheio de defeitos. Como Hud Bannon, em “O Indomado” (1963), Paul Newman era um rancheiro no Texas que procurava uma boa vida e queria vender gado doente para conseguir isso. O personagem tinha a intenção de fazer o público sentir repulsa, havia dito Paul Newman numa entrevista. Ao contrário, ele disse, “criamos um herói folclórico”.

Auto-destrutivo em “Rebeldia Indomável” (1967), Paul interpretava um rebelde “detonado” por um brutal sistema prisional. Como Butch Cassidy em “Butch Cassidy” (1969), ele fez o mais amável e engraçado dos assaltantes de bancos, memoravelmente acompanhado de Robert Redford. Em “Desafio “a Corrupção” (1961), ele interpretou Fast Eddie, um papel recriado por ele 25 anos mais tarde, agora como o bem sucedido e maduro vendedor de bebidas em “A Cor do Dinheiro” (1986). Seu desempenho valeu o único Oscar de sua carreira como Melhor Ator pela Academia, após ter sido indicado seis vezes ao prêmio anteriormente (na categoria principal) e uma vez (na categoria de coadjuvante, por “Estrada para Perdição”).

“Quando um papel é bom para ele, ele é inigualável”, escreveu a crítica Pauline Kael, em 1977. “Newman fica mais à vontade num papel quando ele não é escalado para interpretar personagens de forma heróica; mesmo quando interpreta um bastardo, ele não é um grande bastardo – somente um sujeito imaturo, egoísta, como Hud. Ele pode interpretar o que ele não é — um grosseiro tosco. Mas você não acredita quando ele interpreta alguém mau ou corrupto, e quanto mais maduro ele fica, mais você o conhece, e menos você acredita. Sua previsibilidade é contagiante; ninguém, nunca, deveria pedir para não gostar de Paul Newman.”

Mais do que um astro do cinema, e algumas vezes do teatro, Paul Newman, era um showman, um filantropo e, depois de completar 75 anos, um corredor de carros. Em 1995, em seu septuagésimo aniversário, presenteou-se participando de uma corrida em Daytona. Quando venceu a corrida, entrou para o “Guinness Book of Records” como o mais velho vencedor de uma corrida em sua categoria.

Em 1982, decidiu comercializar um molho de saladas que criou e engarrafou para amigos no Natal. Assim, nascia a própria marca de Newman – “Newman´s Own” - uma companhia iniciada com seu amigo A. E. Hotchner, o escritor.

Mais de 25 anos mais tarde, a marca expandiu-se, diversificando para outras especiarias, incluindo limonadas, pipocas, molhos de macarrão, pretzels, figos orgânicos e vinhos. Sua filha, Nell Newman, administra o braço de alimentos orgânicos da companhia. Todos os lucros, de mais de 200 milhões de dólares, são doados para instituições de caridade, segundo a companhia.

Muito do dinheiro foi usado para criar a “Wall Gang Camps”, o nome dado para a gangue dos fora-da-lei em “Butch Cassidy.” Os campos fornecem recreação grátis no verão para crianças com câncer e outras doenças. Esteve ativamente envolvido no projeto escolhendo chapéus de caubói como instrumento, para que as crianças sem cabelo por causa da quimioterapia pudessem disfarçar suas carecas.

Muitos anos antes da criação da marca “Newman´s Own”, em 28 de Novembro de 1978, Scott Newman, o mais velho de seus 6 filhos – e único homem – morria de overdose de pílulas e álcool. O monumento de Paul para seu filho foi o Scott Newman Center, criado para divulgar os perigos das drogas e álcool. É administrado por Susan Newman, a mais velha das cinco filhas.

As três filhas mais jovens são frutos de seu segundo casamento de mais de 50 anos com a atriz Joanne Woodword. Paul e Joanne fizeram parte do elenco — ela como substituta — na peça da Broadway “Picnic” em 1953, depois interpretados no cinema, na versão “Férias do Amor” (1955), por William Holden e Kim Novak. Iniciando com “O Mercador de Almas” (1958), eles co-estrelaram 10 filmes, incluindo “Paixões Desenfreadas” (1960), baseado no romance de John O’Hara sobre um executivo manipulado e sua esposa infiel; “Meu Pai, Eterno Amigo” (1984), também dirigido, produzido e que Paul ajudou a escrever; e “Cenas de Uma Família” (1990), a versão de James Ivory de uma série de romances de Evan S. Connell, no qual Paul Newman e Joanne interpretam um casal conservador do centro oeste norte-americano lidando com as mudanças da vida.

Quando bons papéis não surgiam para Joanne, Paul produziu e dirigiu “Raquel, Raquel” para ela em 1968. Indicado para o Oscar de Melhor Filme, mostra a sensível história de uma professora solteirona em busca do amor e deu a Joanne sua segunda indicação de um total de quatro para Melhor Atriz – ela venceu em sua primeira indicação, interpretando a esquizofrênica Eve, em “As Três Faces de Eva” (1957) e foi indicada novamente pelo seu papel em “Cenas de Uma Família” e, em 1973, pelo filme “Lembranças”.

Paul Newman também dirigiu sua esposa em “Os Efeitos do Raio Gama nas Margaridas do Campo” (1972), - papel que deu à nossa Nicete Bruno, em 1974, o Prêmio Molière de teatro -, “À Margem da Vida” (1987) e no filme para a televisão “A Caixa de Surpresas” (1980). Como diretor, seu maior desafio foi “Uma Lição Para Não Esquecer” (1971), baseado no romance de Ken Kesey.

Numa indústrias na qual casamentos de longa duração podem ser definidos como aqueles que duram o primeiro ano e a primeira infidelidade, Newman e Woodward superaram essa batalha. Mas admitiram que geralmente houve turbulências. Ela amava opera e ballet. Ele gostava de jogos práticos e corrida de carros. Mas como Paul Newman havia comentado na Playboy magazine, em uma de suas inúmeras entrevistas que era perguntado sobre fidelidade conjugal, “Eu tenho filé em casa; por que vou sair em busca de hamburger?”. Lá se vai um dos grandes do cinema. Pena para a gente.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

OS AMORES DE CARMEN

“Senhorita? Eu?.”


Estrelado por uma das divas do cinema dos anos 40, Rita Hayworth, sempre linda e charmosa, essa versão de "Carmen", entretanto, não agrada demais. Afetada, fica nítido que Rita não passa na tela o que deveria no papel da clássica cigana vamp de Mérimée. Excesso de postura, poses e pitadas desnecessárias de paixão é o que mais pode ser visto no personagem interpretado pela atriz. Infelizmente, a música da ópera de Bizet não faz parte do filme. Apesar disso, Rita tenta dar vida à cigana, utilizando-se de trajes típicos, cabelos revoltos e dançando - como poucas atrizes de sua época no cinema souberam fazer -, chamando atenção aos seus gestos, rosto, olhos e lábios, que foram extremamente explorados pelos fotógrafos de Charles Vidor (produtor e diretor do filme), em Technicolor. Provavelmente, a maneira explosiva e vibrante de Rita, assim como seu humor tempestuoso no filme, sugere a pesada orientação dramática do diretor.

Mas, as faíscas eletrizantes de personalidade que podiam dar brilho ao papel faltam a seu desempenho, de modo que a lasciva cigana concebida por Mérimée é substituída aqui por uma personagem muito produzida e às vezes não convincente – talvez teatral.

Alguns números musicais são interessantes, embora a melodia interpretada pelos cancioneiros em uma serenata possa parecer um pouco infantil para um casal de amantes ardentes. O Don José da obra, que é um sujeito arrogante, no filme parece derrotado e inseguro na interpretação de Glenn Ford.

Victor Jory está bem como o delinqüente cigano marido de Carmen, Garcia, e nos dá os melhores momentos do filme, lutando com Don José, em duelo com facas. Entretanto, o resto do elenco parece superficial, assim como os cenários (bem cuidados), mas exageradamente artificiais.

Parece-me que esta versão foi inspirada por “Carmen”, versão franco italiana dirigida por Christian-Jaque em 1945, estrelada por Viviane Romance e que, segundo dizem, apesar de muito mais barata que o produto hollywoodiano, é superior. Ver para crer.



"Os Amores de Carmen" (The Loves of Carmen)
1948 – EUA - 99 min. – Colorido – DRAMA
Direção: CHARLES VIDOR. Roteiro: HELEN DEUTSCH, baseado no romance homônimo CARMEN de PROSPER MÉRIMÉE. Fotografia: WILLIAM SNYDER. Montagem: CHARLES NELSON. Música: MARIO CASTELNUOVO-TEDESCO. Produção: CHARLES VIDOR, para a COLUMBIA PICTURES.

Elenco: RITA HAYWORTH (Carmen) GLENN FORD (Don José), RON TANDELL (Andrés), VICTOR JORY (Garcia), LUTHER ADLER (Dancaire), ARNOLD MOSS (Coronel), JOSEPH BULOFF (Remendado), MARGARET WYCHERLY (Anciã), BERNARD NEDELL (Pablo) e JOHN BARAGREY (Lucas).

Trailer Original:



Do mesmo diretor:



Gilda

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

10 BELDADES (+ 1)

Atendendo à Miriam do blog Tribo da Leitura, deixo aqui a lista de algumas das mais lindas mulheres do cinema. Sem querer sem injusto (porque neste campo as injustiças rolam solto), ou definitivo (porque há milhares de maravilhas que a telona eternizou e a lista é pequena), deixo aqui aquelas que neste dia vieram à minha lembrança como mitos, e cujas vidas artística e pessoal, de certa forma, ajudaram a transformá-las em símbolos de um Cinema que ainda nos tempos de hoje se tenta resgatar. Aqui estão elas, sem ordem de favoritismo (não consegui somente dez, mas onze). Fica difícil de não concordar, vocês não acham?










Audrey Hepburn

















Ava Gardner
















Gene Tierney



















Grace Kelly

















Greta Garbo

















Hedy Lamarr


















Ingrid Bergman

















Jean Harlow


















Marilyn Monroe

















Rita Hayworth

















Vivien Leigh











Repasso o desafio aos amigos dos seguintes blogs:

Blog dos Cinéfilos
Cinemorama
Mapa do Meu Nada
Moviemento
Século da Luz
Tudo é Crítica

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

O SOL POR TESTEMUNHA

“Um pobre diabo também pode ser inteligente”


Porque a vida boa fica sempre para os outros? Como se faz para ter o luxo das pessoas ricas e bonitas? No mesmo ano em que “A Doce Vida” de Fellini conquistava as telas, outro filme abordava o tema de forma mais obscura. Marcello Mastroianni, o alter ego de Fellini, perdia sua identidade entre estrelas e prazeres sexuais. Tom Ripley não a tem. Apodera-se de uma, praticando um assassinato. O cenário é o mesmo. Roma, Via Veneto: os norte-americanos Philippe Greenleaf (Maurice Ronet) e Tom Ripley (Alain Delon) desfrutam da vida à la italiana, na boêmia. O dinheiro não tem importância - o velho pai de Philippe paga tudo. De fato, o milionário empresário havia contratado Tom para que convencesse seu filho a regressar à América. Mas, Tom, não pensa em fazê-lo. Ao contrárrio, embolsa as mesadas de Philippe, toma conta de sua vida despreocupada e rouba o amor de sua noiva, Marge (Marie Laforet). Quando o senhor Greenleaf percebe ter fracassado em sua missão, Tom torna arquiteta seu verdadeiro plano: desfaz-se do amigo e assume sua personalidade. Ripley, então, converte-se em Philippe Greenleaf, cosmopolita e filho de um milionário.

O assassinato a sangre frio é o prelúdio do verdadeiro objetivo e vocação de Tom: a farsa, sempre a ponto de ser desmascarada. Imita a voz de Philippe, falsifica sua assinatura e escreve cartas na máquina de datilografar do morto. Entre as medidas de precaução que toma, estão as trocas constantes de hotel, os encontros evitados para não haver confrontos e um segundo assassinato. Freddy Miles (Billy Kearns), um amigo de Philippe, descobre seu jogo duplo. Eliminar o cadáver coloca-o em maus lençóis. Entretanto, nada parece incriminar Tom Ripley – para todos, o nome do assassino é o de Philippe Greenleaf.

O relaxado estilo de vida mediterrâneo, o jogo de luzes do sol sobre os corpos bronzeados e a música de Nino Rota, o compositor favorito de Fellini, marcam a atmosfera enganosa deste suspense psicológico classe A. Por trás de tudo, ocultam-se os abismos da alma humana. Quem é Tom Ripley? O que o leva a identificar-se com Philippe? Narcisismo? Cobiça? Pura imoralidade? Seja o que for, Marge fica impotente diante dos dois homens. Muito mais significativa é uma cena logo ao início em que Tom posa diante do espelho do guarda roupa de Philippe e este o surpreende.

Comparar este filme com a versão norte americana “O Talentoso Ripley” (1999) não requer nenhum exercício intelectual. Em ambas versões, deparamo-nos com um Ripley totalmente distinto, outro Philippe e outra Marge. Com Matt Damon, Anthony Minghella mostrou um Ripley completamente novo, movido, sobretudo, por seus medos e instintos.

Por outro lado, Alain Delon dá vida ao personagem com uma distinta elegância. Suporta as humilhações de Philippe sabendo-se superior, em silêncio. Os assassinatos sucedem quem sabe por acaso. Não obstante, as mentirosas manobras posteriores são previamente planejadas nos mínimos detalhes.

Patrícia Highsmith esboçou Tom Ripley como um farsante sedutor que, para a alegria dos leitores, não conseguia deter suas ações. René Clément, um dos diretores mais destacados do cinema francês do pós-guerra mudou esse enfoque. Apesar do sabor amargo do final, ele carrega uma dose máxima de suspense que caracteriza todo o filme. Em 1996, Martin Scorsese restaurou o filme. Sorte nossa.



"O Sol Por Testemunha" (Plein Soleil)
1960 – FRANÇA/ITÁLIA - 116 min. – Colorido – SUSPENSE
Direção: RENÉ CLÉMENT. Roteiro: RENÉ CLÉMENT e PAUL GÉGAUFF, baseado na novela "O Talentoso Ripley" de PATRICIA HIGHSMITH. Fotografia: HENRI DECAË. Montagem: FRANÇOISE JAVET. Música: NINO ROTA. Produção: RAYMOND HAKIM e ROBERT HAKIM para PARIS FILM, PARITALIA e TITANUS.

Elenco: ALAIN DELON (Tom Ripley) MAURICE RONET (Philippe Greenleaf), MARIE LAFORÊT (Marge Duval), ERNO CRISA (Riccordi), ELVIRE POPESCO (Senhora Popova), FRANK LATIMORE (O´Brien), BILLY KEARNS (Freddy Milles), LILY ROMANELLI (Ama de Llaves), AVE NINCHI (Senhora Gianna) e NERIO BERNARDI (Chefe da Agência).

Trailer Original:



Do mesmo diretor:



Jaula Amorosa

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

INIMIGO PÚBLICO

“Poderia te amar até a morte.”


Quando, no início dos anos 30, uma série de filmes de gângsters fundaram um novo gênero cinematográfico, logo houve protestos contra a glorificação desta figura do crime. No fundo, o gângster somente perseguia, ainda que utilizando-se de más práticas, os mesmos objetivos dos heróis e das pessoas de bem: êxito na esfera profissional e felicidade na vida particular. Realizar-se com o mínimo esforço e possuir um estilo de vida independente parecia fácil ao cowboy urbano. Tom Powers (James Cagney), um dos primeiros ícones do gênero (senão o primeiro), encarna este drama ambíguo do herói glorioso e do anjo caído. O filme mostra a trajetória criminosa do personagem com uma sensibilidade incomum ao relacionar sua evolução social e pessoal – inicia com um garoto de rua que pretende enfrentar as injustiças de uma época de crise econômica; segue com sua ascensão, como cúmplice e braço direit de diferentes mafiosos, convertendo-se em um assassino frio e dândi e, finalmente, sua queda.

A vida de Powers é mostrada como uma biografia Podemos perceber circunstâncias históricas, tais como os problemas que a industrialização e a nova orientação econômica provocaram no inicio do século passado nos Estados Unidos, a Primeira Guerra Mundial - em que participou Mike (Donald Cook), irmão de Tom – e os anos da Lei Seca, nos quais a proibição de bebidas alcoólicas fez um terreno fértil para a Máfia. A luta de sua mãe para criar os filhos - inimigos irreconciliáveis - a ausência do pai ou as relações instáveis do protagonista com seus pares cuidam de retratar com uma indiferença alarmante o fracasso do modelo tradicional da família.

Por outro lado, a liberdade com que Tom Powers burlando a lei e padrões sociais o colocam constantemente em situações delicadas, para não dizer precipitadas. Exemplo disso é quando ele, ao volante de seu automóvel de luxo junto com seu amigo e cúmplice Edward Woods (Matt Doyle), aborda de improviso em plena rua a atraente e misteriosa Gwen Allen (Jean Harlow), inicia uma aventura amorosa com ela e, também de improviso, coloca um ponto final no romance.

Apesar da agressividade contra as mulheres (por exemplo, quando Tom aperta com força o rosto de sua noiva), alguns elementos como o assassinato por vingança do gângster Putty Nose (Murray Kinnell), que lembra uma execução, ou as armas da mais moderna tecnologia, incluindo metralhadoras e granadas (que se tornaram ícones do gênero), trazem em cena uma qualidade até então desconhecida no cinema.

O mesmo ocorre com a linguagem visual arrebatadora do filme. Numerosos primeiros planos, a renuncia a planos gerais que possibilitam uma vista panorâmica, a alternância de cortes e um sem numero de tomadas realizadas por debaixo da perspectiva normal, que agigantam os personagens e as ações, provocam efeitos dramáticos extraordinários em uma atmosfera de constante insegurança e ameaça até chegar ao estranho final, no qual esse emocionante filme de gângsters quase beira o terror.



"O Inimigo Público" (The Public Enemy)
1931 – EUA - 84 min. – Preto e Branco – DRAMA
Direção: WILLIAM A. WELLMAN. Roteiro: ROBERT HARVEY F. THEW, baseado em texto homônimo de KUBEC GLASMON e JOHN BRIGHT. Fotografia: DEVEREAUX JENNINGS. Montagem: EDWARD M. MCDERMOTT. Música: DAVID MENDOZA. Produção: RRYL F. ZANUCK para WARNER BROS.

Elenco: JAMES CAGNEY (Tom Powers) JEAN HARLOW (Gwen Allen), EDWARD WOODS (Matt Doyle), JOAN BLONDELL (Mamie), BERYL MERCER (Sra. Powers), MAE CLARKE (Kitty), DONALD COOK (Mike Powers), LESLIE FENTON (Nails Nathan), ROBERT EMMETT O´CONNOR (Paddy Ryan) e MURRAY KINNELL (Putty Nose).

Trailer Original:


Do mesmo diretor:



Nasce Uma Estrela